17.2.11

Sobre o Perdão, Fraternismo, Benevolência e outras questões práticas

Por Dr. Fernando Salvino
Parapsicólogo Clínico e Psicoterapeuta


Pergunta: Praticar o perdão sincero compreendi, mas poderia comentar mais sobre isso quanto à dinâmica social?
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O perdão sincero ocorre quando eu consigo compreender e alcançar a profundidade do outro de um ponto de vista do outro e não do meu e, com isto, cicatrizar minhas feridas emocionais que sempre estão ancoradas tanto em fatos como nas fantasias associadas a estes. Fantasias estas que são as distorções criadas pela minha mente de forma a me convencer de que tenho a razão e a outra pessoa é culpada pelo erro abomivável que cometeu, e merece ser julgada, criticada ou culpada, sofrendo penalidades.

Esta dificuldade está associada, ao meu ver, a múltiplos fatores, mas posso resumir na seguinte palavra: egoísmo. O egoísmo é a expressão mais direta da auto-importância. Nos julgamos importantes a ponto de acreditar, fantasiar, que aquilo que o outro nos faz e que julgamos errado, feio e pecaminoso, é dirigido para nós; ou seja, é algo pessoal. O ponto de vista que trago aqui é diferente: em geeral, não somos importantes coisa nenhuma para os outros. Para os outros, quem é importante é o si mesmo e resumo na seguinte frase: "eu sou importante". A auto-importância  não é a auto-estima ou o amor próprio. A auto-importância é a crença da superioridade aos demais e que fortalece o significado que os atos dos outros tem perante nós. Assim, quanto mais importante creio que sou, quanto maior é meu narcisismo, maior será o ressentimento, a raiva, o rancor, o ódio da pessoa que cometeu um ato que eu mesmo julguei abusivo. Detalhe: o significado de abusivo está relacionado diretamente com o nível de auto-importância que alimento. Por outro lado, se alimento uma percepção franca, honesta e sincera de mim mesmo, continuamente, com os pés no chão da realidade de mim mesmo, tal atitude age como vacina contra as emoções tóxicas. E, as emoções tóximas intoxicam a quem? A quem cometeu um dano contra mim? Em termos. Até intoxica devido ao fato de que as ondas mentais e emocionais se propagam no espaço como a energia que atinge a outra pessoa, que acaba sentindo a pressão do conflito instalando em meu interior. Mas, em termos mais precisos, o único maior prejudicada pelas toxinas emocionais sou eu mesmo, porque é dentro de mim que tais emoções negativas pulsam e corroem meu interior, afastando-me de meu núcleo. A auto-importância então é a fachada, a máscara da crença da auto-desvalorização: aqui eu creio que no fundo não valho nada ou muito pouco. a dificuldade do perdão está justamente na crença de que não valho nada ou não merceço valor. Para resolvermos definitivamente tal dilema de profundo sofrimento, da alta psicopatologia que se manifesta de múltiplas formas em muitos distúrbios, precisamos criar o sentimento sincero de que merecemos e que somos dignos de estima e valorização. Assim, passamos a olhar gradualmente os agressores como pessoas que alimentam dentro de si mesmas potentes sentimentos de auto-desvalorização. O perdão é mais que o libertar o outro, é antes de tudo, auto-libertação de toda toxina emocional derivada do ódio e da raiva que alimentamos perante outros que julgamos que nos fizeram o mal. É necessário aqui revermos nossas crenças e experiências de vida a fundo. Pode ser pela psicoterapia, pode ser sozinho. De qualquer forma, uma mudança de percepção é necessária para que o sentido do perdão seja compreendido mais em sua essência. O perdão além de perdoar o outro, agressor, liberta a si mesmo, como auto-perdão. Aos poucos temos que gradualmente perdoar a nós mesmos por erros cometidos no passado, por imaturidade e ignorância, ou mesmo por má intenção que tivemos. E dar passos adiante no caminho da maturidade mais integral e lúcida.

O impacto disso tudo em nível social e parassocial (extrafísico) pode ser percebido nas guerras, genocícios, lutas entre doutrinas, religiões, pensamentos, filosofias, linhas de ciência, na família e num nível mais micro, no casal e na relação com os filhos, na escola, e assim por diante. Manifesta-se na dificuldade com o diferente, com aquilo que é diferente de nós mesmos. É fácil não ter conflito num grupo de iguais, mas num grupo de diferentes, a coisa complica. O ecumenismo está aqui para tentar transcender as forças que separam os diferentes, na busca do comum. São manifestações da agressividade, juntamente com a ganância, a sede de poder e humilhações de nações, escravidão e subjugação de um povo inteiro a um sistema de castração da sexualidade madura e digna e assim por diante.

Por outro lado, cabe-nos sublimar, transcender todas as forças que modelam nosso núcleo que tentam nos direcionar para a agressividade, sempre danosa. Cabe-nos trabalhamos nosso interior para termos atitude fraterna e não-agressiva, porém, o mais lúcida e o menos inoscente. Os danos da inoscência também são nefastos, vide aquela pessoa humilde da roça que acredita nas palavras bonitas e sedutoras do político de que o mesmo irá ajudar as pessoas e acaba votando nele. Após, o político desvia milhares de reais das contas públicas e não aplica o que prometeu. O cidadão de bem fica revoltado, naturalmente, com tal ato.
Cabe ao Estado, nas mãos de pessoas de bem, mais lúcidas, proteger, amparar a sociedade num sentido de aplicar corretamente o Direito diante destes casos de corrupção, por exemplo. Um dos maiores problemas sociais hoje é a corrupção: ela corrói todo o sistema, abre margens para o intrusão dos estados paralelos no governo e a contaminação do Estado, tornando-o doente. Na raíz, está a auto-agressão: os corruptos plantam as sementes de sua própria desgraça ao realizarem tais atos, diante do impacto que geram nas pessoas de bem, pagadores de tributos.

Cabe-nos ampliar a compreensão sociológica e mesmo a psicológica, parapsicológica em níveis mais profundos, pelo autoconhecimento e pelo interesse no humano, para que possamos estar aqui no mundo, sem rancor, sem arrependimento, sem vontade de fugir daqui e, por fim, literalmente encarnarmos e aceitarmos o fato de estarmos aqui, num mundo ambínguo e plural, diverso e complexo, e que foge ao nosso entendimento completo e definitivo, por mais que nos esforçemos para tal. E lidar com esta falta, este "nada", esta "impotência" em saber tudo, em conhecer tudo, parece-me que é a porta da liberdade e do estarmos vivendo na realidade mais próximo de como ela é.

De um ponto de vista prático, vale compreender o nível de egoísmo que estamos. Vale começar, como já coloquei, a realizar algum tipo de serviço voluntário, humanitário, com vistas a cicatrizar as feridas do egoísmo e a abrir o espaço para a fraternidade, expandindo as energias afetivas e unindo-as às energias mentais e mesmo as sexuais, equilibrando o campo de energia (aura). Necessário praticar continuamente o perdão para filtrar a agressividade e abrir os canais do afeto sincero por si mesmo e pelos outros.



Se você não sabe o que faz no mundo, não importa: começa a ajudar as pessoas. Tente fazer o movimento de sair de seus próprios problemas. Muitas pessoas têm muito mais problema que você e você pode ajudá-las. Pode ser um pouco, mas você pode. Certamente se conseguir fazer um movimento como este, começará a sentir-se mais feliz. A vida, por um lado é complexíssima de compreendermos, mas por outro é simples.