13.1.15

Sobre a Institucionalização da Verdade e Liberdade

Fernando Salvino (M.Sc)
Parapsicólogo, Psicoterapeuta
Professor, Pesquisador e Divulgador da Holocosmologia e do Yoga, especialmente o Yoga chinês.


Este ensaio nem pode ser chamado de ensaio, seria melhor rascunho, rabisco. Seu objeto é também simples, mas em sua vida orgânica, muito complexo. É o simples complexo: a institucionalização da verdade.

A verdade vem sendo institucionalizada desde os tempos antigos. Gurus, religiosos, xamãs, políticos, cientistas, ocultistas, filósofos até as pessoas comuns sem qualquer denominação de autoridade da verdade, com seus dogmas e com seus separatismos da verdade em detrimento do outro, não detentor da mesma.

Apesar do fato de que, se todos os "donos da verdade" fossem questionados admitir-se-ia com toda a honestidade que não estão a proclamar A verdade, mas antes, de UMA SUPOSTA verdade. Estamos a falar de um paradigma, como modernamente se coloca, ou como prefiro, uma concepção de realidade, que está completamente dependente do grau cognitivo, da percepção e do nível de discernimento e inteligência do sujeito em relação àquilo que pretende conhecer ou que se diz que conhece, o objeto.

O conhecimento do objeto percebido é a medida do sujeito percebedor. Assim conhecemos aquilo que se restringe aos nossos limites de conhecer, portanto, não acessamos a verdade, mas concebemos uma forma de conhecimento restrita ao que somos e aos nossos limites. Este conhecimento não é verdadeiro em si, pois que, se o sujeito modificar seu discernimento eis que a verdade também se modifica. Então, estamos a tratar da verdade?

Não, é evidente que não. Estamos a tratar de concepções da realidade e não da realidade em si mesma, pura.

A sociedade humana e suas diferenças em todos os níveis evidentemente também irá produzir saberes limitados àqueles sujeitos assim restringidos por seu contexto e seus dogmas, repressões e censuras.

É aqui que se encontra os grandes ramos mais idolatrados pela modernidade:

Ciência - Filosofia - Religião

E estes grandes ramos são pinturas mal feitas da paisagem holocósmica.

Há de existir uma forma de acesso direto à verdade, porém, esta inclui necessariamente o subjeito percebedor, o sujeito de conhecimento, a subjetividade, a inteligência, o abstrato interno que pulsa em todos nós em suas relações com aquilo considerado o outro, o que não é o sujeito, até a transcendência desta separação artificial, na unidade vivida e na dissolução total da separação.

Neste nível não existe concepção alguma da realidade, mas a vivência da realidade em si, a partir da dissolução do espaço-tempo e da vida consciencial pura, livre em holofusão, holocósmica.

É a realidade em si, enquanto consciência sem ego em dissolução de toda separatividade e unidade orgânica universal.

Somente neste nível vislumbramos o princípio de uma sociedade verdadeiramente cosmoética que se une a partir de uma realidade subjacente a toda concepção de realidade, o fundamento da irmandade universal e da paz definitiva.

A isto se chamou Kaivalyam, estado Tai Chi (ou Ji), comunhão com Tao, união com Brahman e assim por diante.

É o início do entendimento do "vazio" como sustentáculo do "cheio". Daí se afirmou que:

Do Wu-Ji nasce o Tai-Ji e a partir do Tai-Ji chegamos as 10.000 coisas.

Porém até isto não passa de uma concepção e não da realidade em si.

A partir do entendimento de que uma dada concepção seja correta ou julgada assim muito boa, passa-se a idolatrar esta concepção e não raro seu criador, transformando-o em guru, mestre, gênio, e, ao seu redor, centenas, milhares de pessoas carentes e crentes rodeiam o  guru e a concepção na busca de salvação, segurança interior e vida próspera.

Este fenômeno gera verdadeiro impacto econômico, empresas são criadas, dinheiro circula facilmente, prédios são construídos, mensalidades são cobradas, cursos, aulas, palestras, cultos. E aqui não importa ser algo de uma suposta ciência, religião ou filosofia. Neste nível institucionalizou-se a verdade.

A autopesquisa parapsíquica, ou o estudo de si mesmo em profundidade além dos sentidos orgânicos, incluindo todas as nossas capacidades assim consideradas parapsíquicas, incluindo os de ordem psi-gama, psi-theta, psi-kapa e psi-ómicron, potencializam a visão mais pura da realidade e imunidade à sedução de se institucionalizar a verdade.

A verdade não nasceu para viver entre muros. O que está fora é maior do que está dentro.

A isto refiro-me principalmente as linhas científicas, ou assim consideradas, as mais avançadas, dizendo, Psicologia, Parapsicologia, Projeciologia, Conscienciologia e assim por diante. A sua institucionalização fez com que tais áreas tornassem-se verdades institucionalizadas.

Quando uma ciência, filosofia ou religião se institucionaliza não seria exagero afirmar que tornou-se doente. A doença da ciência é fecha-la em quatro paredes, certificar os doutos e excluir os demais. Assim cria-se o clero e as mensalidades.

As instituições assim consideradas conscienciocêntricas refletem justamente isto: com a verdade institucionalizada, com seus cursos curriculares e com seus "pastores" treinados, tenta-se apropriar de determinada ciência ou objeto de ciência e ditar regras inclusive de conduta para os adeptos, que reagem como rebanho dos pastores.

E a essência se perde. A consciência torna-se concebida como um ego e seus veículos e acredita-se nesta versão.

Assim, perde-se a noção clara de que qualquer concepção, por mais interessante que seja, por mais racional que seja, por mais aparentemente bela e precisa seja, nada mais é que mais uma concepção da realidade e não a realidade em si.

Pois, enquanto houver a concepção de que uma concepção é melhor que outra o que justifica a construção de muros no planeta, de fronteiras entre países, de divisões culturais e guerras psicológicas entre gurus, seitas e linhas religiosas, ainda teremos um longo tempo de sofrimento no planeta.

Porém, se compreendermos o fato de que concepções são como as estações do ano, ou seja, pertencentes ao nível de realidade sujeito à mutação, a impermanência, então começaremos a tentar "ver" o que está por trás da mutação, o eixo holocósmico geral, o fundamento da mutação, na subjetividade invisível do mundo das formas e das aparências. Estaremos tentando "ver" donde vem as infinitas concepções da realidade,  no centro abstrato e não-local da consciência, na incorporeidade subjetiva total do ser e na dissolução da fronteira entre o eu e o não-eu, o eu e o ambiente, o eu e o holocosmo, até a holofusão.

O caminho que leva o sujeito à transcender o eu, dissolver as fronteiras que o dividem com o suposto ambiente externo, dissolver com isto todo o sofrimento, alcanaçar um nível de realidade transconceptual no fundamento de todo o conhecimento transitório possível, é chamado de Yoga, o Yoga puro, livre de todo guru e instituição.

Porém, ainda assim, e só por estar usando palavras para tentar expor ideias, que são derivadas de concepções da realidade, e só por isto já temos indício de se tratar de mais uma concepção e por isto é necessário considerar assim algo transitório, impermanente. Assim, qualquer coisa comunicada e que passe por quaisquer dos sentidos assim orgânicos, a fala, a escrita, a comunicação gestual e assim por diante até a abstração matemática dos simbolos e fórmulas ainda sim são concepções da realidade e não a realidade em si, e portanto, impermanentes como tudo o mais.

Assumir que não sabemos exatamente qual é a verdade, faz com que todas os muros que dividam a verdade da mentira ou da falsidade caem. A verdade de hoje é a mentira de amanhã. A mentira de hoje pode ser a verdade de amanhã, porém, na essência nenhuma delas é absolutamente verdadeira ou absolutamente falsa, mas ambas são concepções assim consideradas melhores ou piores dentro de um contexto cultural e político.

E por fim, lembremos que o princípio "não acredite em nada, nem mesmo no que leu aqui neste ensaio, tenha suas experiências", ainda sim é uma concepção.

O objetivo deste ensaio foi discernir "concepção de realidade" do conceito de verdade ou mentira, e situar o território da concepção da realidade como um campo tendente à muros e institucionalizações, para proteger a verdade e seus criadores, com certificações e com a mercantilização da verdade, dando a pseudo-segurança para os seguidores a partir das verdades ditadas pelos professores e gurus e pela contrapartida financeira e outras recompensas.

Apesar de ainda ser necessário existir no planeta, em decorrência da diversidade em discernimento, as instituições tenderão a se dissolver conforme as pessoas vão acessando a realidade em si mesma.

A partir disto o que fica é o amor puro como resídio do entendimento da holofusão de tudo com tudo e da natureza comum de todos, a partir da dissolução progressiva do ego (consciência em egoidade) até o eu holocósmico.

É o início do entendimento do cosmodireito, da cosmoética, da sociedade universal, da holocosmologia.